Arrematação e adjudicação de bem imóvel
Classificação como forma de aquisição originária e seus efeitos
- Da aquisição da propriedade imóvel
Doutrinariamente, sabe-o toda a gente, que a aquisição da propriedade imóvel se dá de dois modos. Um, refere-se ao modo originário, quando o adquirente recebe esse título de forma direta e independente do antigo proprietário, sem com este manter qualquer vínculo. Outro se concebe de modo derivado, reclamando a vinculação do adquirente a outra pessoa, pressupondo um ato ou um negócio jurídico de transferência da propriedade para o adquirente.
Nesse sentido a sempre esmerada observação de Washington de Barros Monteiro, para que “… os modos de adquirir a propriedade dividem-se em originários e derivados. Nos primeiros, a aquisição é direta e independente de interposição de outra pessoa, o adquirente faz seu o bem, que lhe não é transmitido por quem quer que seja. São modos originários a aquisição da propriedade por ocupação, a especificação e a acessão. Nos segundos, a aquisição tem como pressuposto um ato de transmissão por via do qual a propriedade se transfere para o adquirente. Tais são a transcrição e tradição” (Curso de direito civil. 25ª ed. São Paulo: Saraiva, 1986, 3ª vol. p. 101).
- Instrumentalidade da arrematação e da adjudicação
Execução forçada é “uma cadeia de atos de atuação da vontade sancionatória, ou seja, conjunto de atos estatais através de que com ou sem concurso da vontade do devedor (e até contra ela), invade o seu patrimônio para à custa dele, realizar-se o resultado prático desejado concretamente pelo direito objetivo material” (Execução civil. 4. ed., São Paulo: Malheiros, p. 112).
Deveras, através dele, o particular bate às portas do judiciário, instaurando instância de atos ordenados, e coordenados, objetivando expropriar bens do devedor, coativamente, contra a vontade dele, a fim de satisfazer o direito ostentado e espelhado em título executivo judicial ou extrajudicial. No processo de execução não há contraditório, sequer sentença; há apenas observância a preceitos fundamentais do contraditório, sem com isso destoar da salvaguarda do direito líquido, certo e exigível daquele que se viu obrigado a se socorrer do monopólio estatal da jurisdição.
É na vereda processual que se encontram os alicerces básicos que sustentam os institutos da arrematação e adjudicação. Nela, ainda, que se vislumbra a doutrina do advogado paranaense Francisco Raitani, recordando que “a arrematação não é contrato, embora se devam reconhecer as dificuldades extremas para a perfeita caracterização do ato” (Prática de processo civil. 21. ed., São Paulo: Saraiva, v. II, 1997, p. 588).
Mantendo-se ainda a linha de pensamento prefacial, a título de conceituação do instituto, tem-se a arrematação como sendo “um ato do processo de execução, antecedido de edital, no qual em hasta pública, ou leilão são adquiridos os bens penhorados, por terceiros, através de pagamento em dinheiro ou com adjudicação ao credor, tendo por finalidade a satisfação da obrigação.” A arrematação é, “destarte, um ato de transferência dos bens penhorados no processo de execução, apregoados pelo leiloeiros e adquiridos pelo licitante pelo maior lance” (Pinto Ferreira. Curso de direito processual civil. São Paulo: Saraiva. 1998, pág. 300).
Para o mesmo professor Pinto Ferreira, “adjudicação é a transferência judicial, o ato em que o credor recebe a coisa penhorada, como forma de pagamento total ou parcial do seu crédito… O credor pode, então, requerer sejam-lhe adjudicados, isto é, transferidos para seu domínios, por preço não inferior àquele constante do edital de leilão ou praça” (ob. cit., p. 301).
Essa posição doutrinária, esboçada por Pinto Ferreira, seria bastante exauriente e adequada, não fosse o equívoco, data venia, de tratar a excussão dos bens em hasta pública como ato de “transferência” da propriedade, quando evidentemente não o é, como se verá.
Observe-se, por primeiro, que eventual negócio jurídico havido em hasta pública se dá apenas entre o particular adquirente e o Estado. Sem maiores delongas, pode-se resumidamente tratar a arrematação como verdadeira expropriação jurisdicional, assemelhando-se muito com o instituto da desapropriação versada no direito administrativo e agora, também, no direito civil quando revigorou a posse pro labore (a respeito, confira-se nosso artigo intitulado Anotações sobre a posse pro-labore do novo Código Civil publicado em Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, Porto Alegre; Revista Bonijuris, Paraná e Revista Justilex, Brasília, além de diversos sites e revistas outras). De sua vez, a adjudicação pode representar negócio jurídico atípico, acolhendo elementos da dação em pagamento e da novação.
Afora isso, conquanto estejam esparsamente tratadas em normas de direito essencialmente material, não se exige muito esforço de raciocínio para se vislumbrar que o objetivo dos institutos da arrematação e da adjudicação é, apenas, a satisfação do crédito ostentado pelo credor. Este, devendo se valer da soberania estatal para buscar no patrimônio do devedor a satisfação de seu crédito o fará coercitivamente na fase procedimental adequada.
A adjudicação se verifica quando o credor oferece preço não inferior ao que consta do edital, depois de findada a praça sem lançador (CPC, art. 714). A exemplo do que ocorre na arrematação, a adjudicação só se reputa perfeita e acabada com a assinatura do respectivo auto, expedindo-se a respectiva carta, com observância dos requisitos do artigo 703 (os mesmos da arrematação).
Assim, a arrematação e a adjudicação não são um objetivo em si mesmas, mas tão-somente um meio idôneo visando a consecução daquele fim. Representam, portanto, o instrumento jurídico-processual colocado à disposição do credor para salvá-lo da ruína da perda do crédito legitimamente constituído, indiscutível e exigível.
Importante observar, com Araken de Assis, que “a alienação coativa não depende, com efeito, da vontade do executado. Ela se realiza mesmo contra esta vontade. O ato do órgão judiciário expressa a soberania do estado. Exato, ao propósito, o parecer vetusto de Paula Batista, segundo o qual enxerga, na alienação, no uso da força da lei, a ‘idéia de que a entrega do ramo representa o consentimento do executado pela intervenção do juiz’, revela ficção fútil e pueril’” (Manual do processo de execução. 4ª ed., São Paulo: RT, 1997, p. 575).
A alienação de propriedade imóvel por força de arrematação ou da adjudicação é coativa. A compulsoriedade da cobrança via execução, assim como a excussão dos bens do devedor, retira do ato de alienação qualquer possibilidade de tê-lo como consentido. Este meio deixado à disposição do credor bem se amolda à visão contemporânea do processo, como o instrumento de realização do direito material e de efetivação da tutela jurisdicional, sendo de função predominantemente pública, que não deve prestar obséquios aos caprichos de litigantes desidiosos ou de má-fé.
- Originariedade da aquisição de imóvel em hasta pública
Os fundamentos que tradicionalmente são lançados na classificação da propriedade, quanto a sua origem, calham bem à essência dos institutos instrumentais ora estudados. Não há como, desse modo, sustentar eficazmente que a propriedade transmitida em hasta pública o é de forma derivativa.
Para Araken de Assis, “transfere a arrematação a coisa com todos os ônus que a oneravam, tirante os direitos reais de garantia, porquanto se trata de aquisição derivativa (nemo plus iuris in alios transferre potest quam ipse haberet)” (ob. cit., p. 589). Ousamos, sempre com a reiterada vênia, divergir da abalizada doutrina do mestre sulista. Para nós, à hasta pública não podem sobreviver pendências que anteriormente tisnavam a propriedade plena, nem mesmo servidões, uso, habitação, enfiteuse, usufruto e renda sobre imóvel. A aquisição de bens imóveis em hasta pública, pela arrematação ou pela adjudicação, se dá de modo originário.
A relação jurídica decorrente do arrematante em leilão brota com direito novo, não guardando qualquer relação com o devedor-executado, com quem não haverá nenhuma vinculação do adquirente. O proprietário anterior não transmite o domínio sobre o bem. A aquisição é direta, fazendo o adquirente seu o bem arrematado ou adjudicado, sem que lho seja transmitido por outrem, interposta pessoa. Há apenas intervenção estatal, evidentemente pessoa diversa do titular da propriedade.
O só fato de ser objeto de transcrição (atualmente registro) o auto de arrematação, não torna derivado o modo de aquisição. Não se pode emprestar aqui, genérica e perfunctoriamente, o exemplo de transcrição como forma de transmissão da propriedade ao adquirente pelo antigo proprietário. É originária, como o usucapião, a desapropriação, a especificação, a ocupação e a acessão.
Ora, observadas todas as formalidades da hasta pública, o juiz expedirá o auto e o entregará ao adquirente. Com isso, faz-se desaparecer uma propriedade e dá-se gênese a outra; sem que, contudo, tenha havido uma intervenção, ou sequer uma transmissão voluntária, ordinariamente presente no modo derivativo de aquisição da propriedade.
Irrelevante, ainda, o fato de a coisa ter tido, anteriormente, um dono. Esse critério que Brinz se valia para promover e facilitar a distinção é, “data venia”, tão falho que não serviu sequer como supedâneo na antiga celeuma soerguida em torno do usucapião.
- Efeitos do modo originário da aquisição da propriedade em hasta pública
Na Lei Civil, ainda, um passar d’olhos apenas perfunctoriamente reforçaria a idéia de que, ao arrematante, seriam transferidas todas as pendências havidas sobre o imóvel. Mas não é bem assim. A melhor exegética, relativamente à arrematação e à adjudicação conclui no sentido de que “fica o arrematante inteiramente desvinculado da responsabilidade tributária do executado” (Araken, ob. cit. p. 579). Do contrário, “ninguém arremataria bens em hasta pública, pois estaria sempre sujeito a perder o bem arrematado, não obstante tivesse pago o preço respectivo” (Hugo de Brito Machado. Curso de direito tributário. 7ª ed. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 106).
Veja-se que o inciso III do P. único do artigo 694 do Estatuto Processual Civil trata da possibilidade de se desfazer a arrematação quando o arrematante provar, nos três dias seguintes, a existência de ônus real não mencionado no edital (Por força do artigo 686, inciso V, do Código de Processo Civil, o edital que precede a arrematação deve informar a existência de ônus, recurso ou causa pendente sobre os bens a serem arrematados.). Que outro motivo haveria de inspirar este dispositivo que não a responsabilidade imposta, ao executado, de honrar com os débitos anteriormente havidos no imóvel arrematado? Certamente, pretendeu-se confirmar que o arrematante não assume obrigatoriamente tais ônus; apenas se espontaneamente desejar adquirir o imóvel mesmo com débitos, ônus, etc., o fará.
Noutra passagem, que serve de reforço à idéia ora esboçada, prevê o Código Civil a extinção da hipoteca pela arrematação ou adjudicação, desde que o praceamento do imóvel seja precedido de intimação do credor hipotecário (CPC, art. 698, c/c CC 826). Esta garantia real sobre coisa alheia não poderia ser considerada extinta, acaso a propriedade fosse transferida com todos os ônus que lhe cercam. O que não se permite, frise-se, é a alienação do imóvel em hasta à revelia do credor hipotecário, deixando-o insciente do negócio, pois o descumprimento dessa exigência legal torna nula a arrematação ulterior. Ainda assim, a análise conjunta dos artigos 619 e 694, P. único, inciso IV, do Código Processual Civil evidencia a faculdade outorgada ao credor hipotecário, não intimado da alienação do objeto do gravame, de escolher entre conservar o seu direito real perante o adquirente ou desconstituir a arrematação. A lei impõe apenas uma pena para o adquirente relapso, negligente; o que não desnatura a essência da originalidade da aquisição da propriedade. Se intimado da praça o credor hipotecário, a arrematação extingue a hipoteca, como obtemperou o Superior Tribunal de Justiça ao decidir que “tem conteúdo de aquisição originária a arrematação, donde está livre dos ônus que anteriormente gravavam o bem por esse meio adquirido” (RSTJ 57/433).
Não se deslembre que apenas a propriedade adquirida originariamente rompe todo o cordão umbilical da coisa com o antigo proprietário, não repassando ao adquirente os ônus que pesavam sobre o imóvel. Se a arrematação e a adjudicação têm como condão extinguir o gravame sobre o imóvel, mormente no caso de o credor hipotecário ter sido regularmente intimado da praça, inegável que não se trata de aquisição derivativa.
E mais: a arrematação ou a adjudicação do imóvel, objeto de contrato de locação anterior à alienação em hasta pública, torna denunciável o vínculo locacional (Lei n. 8.245/91, art. 8º, caput, primeira parte), dês que o faça no prazo de 90 dias, contados do registro (§ 2º), cuja rescisão da locação “não se trata de verdadeira hipótese de denuncia vazia, visto como a causa jurídica, o motivo alegado pelo autor da ação de despejo existe, como sendo a própria alienação ou aquisição imobiliária recente” (Carlos Celso Orcesi da Costa. Locação de imóvel urbano. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 36). Não tendo qualquer vínculo com o proprietário anterior, devedor na ação de execução, não haveria sentido lógico compelir o arrematante a respeitar as pendências do imóvel que acabara de adquirir. O mesmo não se aplica, porém, à locação de imóvel rural (Lei n. 4.504/64, art. 92, § 5º e Dec. 59.566/66, art. 15).
A desnecessidade de respeito a contrato anteriormente firmado abrange, também, o comodato. Porquanto, se não foi o adquirente quem estipulou “prazo convencional”, ou “prazo pelo uso outorgado” (situações que o Código Civil manda respeitar), não podem os efeitos do contrato atingi-lo. Simples prestígio ao princípio da relatividade contratual basta para espancar a celeuma. Do contrário, atestar-se-ia a possibilidade de os termos de um contrato atingir, diretamente, quem dele não participou, além de violar direito à propriedade, cujos efeitos “contra todos” fluem mais fortes que os “entre partes” dos direitos pessoais.
Também aspectos do Direito Tributário infirmam os argumentos sustentáculos da teoria sobre a aquisição derivativa. Isso porque, a carta de arrematação a ser levada em registro como título aquisitivo de propriedade, conterá, entre outras coisas, a prova de quitação dos impostos (CPC, art. 703, II). Mas o arrematante não está obrigado a pagar os tributos devidos pelo executado, uma vez que o preço depositado responde pelos tributos por ele devidos (RTJ 89/272, Amagis 9/236), donde se deflui que os impostos referidos pela lei são apenas aqueles inerentes à transferência do domínio, os da própria arrematação, quer dizer, os impostos sobre a transmissão do bem (RT 468/99, RF 250/248, JTA 87/20).
Ademais, se o arrematante pagou imposto predial de responsabilidade do executado e se o produto da arrematação ainda está nos autos, pode haver reembolso por ele no próprio processo (RJTJESP 124/275), posto que “na arrematação em hasta pública, a sub-rogação de créditos tributários decorrentes de impostos, taxas e contribuições de melhoria, cujo fato gerador seja a propriedade, posse ou domínio útil do imóvel arrematado, ocorre sobre o respectivo preço, que por eles responde. Tais créditos tributários, até então assegurados pelo bem, passam a ser garantidos pelo preço da arrematação, recebendo o adquirente o imóvel desonerado dos ônus tributários devidos até a realização do praceamento. Se o preço alcançado na venda judicial não for suficiente para cobrir o débito fiscal, não fica o arrematante responsável pelo eventual saldo devedor” (RT 788/275). Enfim, os débitos fiscais e demais encargos são ônus do executado e não do arrematante (TFR-6ª Turma, Ag. 48.669-PR, rel. Min. Miguel Ferrante, j. 25.2.87, DJU 2.4.87, p. 5.725). Novamente, que razão haveria de ser a da lei, ao reservar para o antigo proprietário os ônus sobre o imóvel, deixando-o integralmente livre e desembaraçado para o adquirente, se não fosse tratar o título como de aquisição originária (sem qualquer laço com o anterior proprietário).
Há quem sustente, contudo, que o “arrematante responde pelas despesas condominiais do apartamento arrematado, pendente à época da arrematação” (RF 288/241). Contudo, somente o condômino responde, proporcionalmente à sua unidade, pelas despesas do condomínio. Ora, se apenas com o registro da carta de arrematação (ou de adjudicação), tem o adquirente a propriedade, tornando-se condômino, não há lógica retroagir-lhe a obrigação pelos pagamentos. Pelos débitos havidos até então responde, apenas e tão-somente, o proprietário anterior. Veja-se que, a exemplo do IPTU, que a Lei Fiscal também imputa responsabilidade ao antigo proprietário (executado), as despesas condominiais constituem-se obrigação “propter rem”, o que força, no mínimo, aplicar-lhe analogicamente a solução tributária para o caso fluente.
Tudo isso, é bom que se diga, pode conceder a entrega do imóvel totalmente livre e desembaraçado ao adquirente, sem prejudicar os créditos anteriormente constituídos sobre a coisa. Os antigos credores terão o seu crédito sub-rogado no preço pago na hasta pública, dês que, às claras, não afetem o crédito do exeqüente na ação. Ou seja: a sub-rogação real atingirá apenas eventuais diferenças creditórias, que se entregariam ao devedor (antigo proprietário), após a transmissão do bem realizada pela adjudicação (que mais se assemelha à dação em pagamento) ou pela arrematação. Não se pode prejudicar terceiro alheio à execução, mas também não se pode deixar ao léu o credor que teve a iniciativa de aparelhar processo de execução visando satisfazer o seu crédito.
Enfim, não pode o adquirente ser compelido ao pagamento do imposto de transmissão de bem imóvel. Esse tributo é devido em face da transmissão. Efetivamente, dispôs-se devido o imposto ante a transmissão, a qualquer título, da propriedade ou do domínio útil de bens imóveis por natureza ou acessão física, como definidos na Lei Civil; e a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos (CTN, artigo 35, incisos I e II).
Sendo originária a forma de aquisição da propriedade realizada em hasta pública, não se há falar portanto em “transmissão”. Impossível cogitar-se acerca da incidência do imposto de transmissão de bens imóveis. Cabem aqui, por absoluta identidade de razões, os argumentos lançados pelo Supremo Tribunal Federal para afastar a exigência do imposto em caso de usucapião (v. RT 623/58 e 599/232) e, no mesmo sentido, entre outros, o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (RT 439/214), afastando o imposto quando a aquisição se faz sem transmissão, isto é, de forma direta e originária (RT 635/206, 557/111 e 569/60). Logo, o imposto sobre transmissão “inter vivos” de bem imóvel não incide nos casos de arrematação e de adjudicação, por não haver transmissão da propriedade, mas aquisição direta e originária.
5. Conclusão
Em que pesem os doutos pensamentos contrários, não nos mostra crível haja possibilidade de se impor o pagamento de eventuais débitos ou o respeito a eventuais onerações, empréstimos ou garantias para aquele que, em hasta pública, adjudique ou arremate bem imóvel. Não se lhe pode transferir a obediência à hipoteca, comodato, locação etc. De igual, não cabe a ele a responsabilização pelo pagamento de tributos inerentes à propriedade (tais como IPTU), taxas condominiais, contas de consumo de energia elétrica, abastecimento de água e saneamento básico, gás etc. Tudo que de algum modo embaraçava a propriedade plena, onerava-lhe ou era cobrado em razão dela, antes da expedição da carta de adjudicação ou de arrematação, não são de responsabilidade do adquirente.
Quer-nos parecer seja essa a explicação lógica e científica da classificação da propriedade, quanto à origem, como originária. Inegável que a única ligação pessoal em razão da coisa atingindo o novo proprietário é com o Juiz que dirige a execução. É o Estado, através do Poder Judiciário, quem possibilitará a aquisição da propriedade, absolutamente independente do consentimento ou da assinatura do proprietário (executado na ação). Não tem o adquirente qualquer negócio ou laço negocial com o antigo proprietário, não podendo, em razão disso, ser considerada derivada a propriedade adquirida em hasta pública.
Indubitável, pois, que inexiste qualquer liame negocial vinculando o adquirente ao antigo proprietário, de modo que torna-se absolutamente iniludível a natureza originária da propriedade imóvel adquirida em hasta pública, donde conclui-se inexistir responsabilidade pelos débitos ou contratos anteriores ao registro do auto respectivo, frise-se.